África - Aspectos Históricos

  • Home
  • África Aspectos Históricos

ÁFRICA - ASPECTOS HISTÓRICOS

A relativa proximidade da África com os continentes europeu e asiático fez com que ela sempre tivesse sido ligada à história ocidental. Sua civilização é milenar, compreendendo complexas e diversas formas de organização econômica, social e política. Ao contrário do mito de um espaço natural rico e exuberante, só presente em pequenas áreas, o continente africano é caracterizado por extensas regiões de colonização difícil pelas precárias condições de sobrevivência. As primeiras denominações dadas a África aparecem em antigos textos europeus e da Ásia Menor. Os gregos a chamavam de Aphriké; os romanos de Afrigah e os fenícios de Afryguah (colônia) ou Apricus (lugar exposto ao sol).

Mapa - A África antes da corrida colonial

 

A ORGANIZAÇÃO SOCIAL TRADICIONAL DA ÁFRICA NEGRA

ESTRUTURA FAMILIAR - o clã, composto por famílias cujos membros possuem antepassados comuns. O parentesco é, majoritariamente, definido pela figura do pai. Os casamentos são realizados com pessoas de clãs diferentes e as esposas passam a viver no clã do marido. Os clãs se desenvolvem no interior das tribos, que ocupam áreas geográficas bem definidas e  apresentam estreitos laços de coesão grupal. A liderança política dos clãs é exercida por um chefe que é responsável pela delimitação e preservação do espaço geográfico clânico. Tradicionalmente, as atividades econômicas do grupo, em média composto por 130 pessoas, são a caça e a coleta vegetal.

ESTRUTURA SOCIAL QUE SE SEGUIU AO CLÃ - a tribo, entidade social mais sofisticada, que dever ter surgido após a domesticação dos animais e do início da produção agrícola. Na organização tribal, há um aumento dos grupos de parentesco e já começa surgir uma divisão social do trabalho mais complexa, responsável pela coesão do grupo que não mais se funda exclusivamente em laços matrimoniais.

A MODERNA COLONIZAÇÃO EUROPEIA

Mapa - Ocupação da África antes de 1884

 

Ao longo da expansão ultramarina europeia dos Tempos Modernos (séculos XVI e XVII), portugueses e espanhóis estabeleceram no litoral africano entrepostos e feitorias destinadas a comercializar madeira, marfim, peles, ouro e notadamente, escravos. De fato, um dos mais rentáveis empreendimentos europeus, quando da etapa mercantil do capitalismo (dos séculos XVI ao XIX), foi  a deportação de contingentes populacionais negros em direção às áreas coloniais da América, onde eram vendidos como escravos. O monopólio desse comércio foi, sucessivamente, cabendo a diversas nações: inicialmente, os países  ibéricos, que forneciam mão de obra às plantations açucareiras antilhanas e brasileiras; no século XVII, os holandeses começaram a participar do nefando comércio, que, a partir do século XVIII, cairia na mão dos ingleses.

O tráfico negreiro teve consequências extremamente negativas para a realidade socioeconômica africana: lutas tribais internas, aniquilamento de tribos e reinos negros e a total decadência do artesanato africano provocada pela entrada de manufaturas europeias. Do ponto de vista humano, o apresamento de escravos representou um verdadeiro desastre: calcula-se que entre 50 e 200 milhões de negros morreram durante os 4 séculos de escravidão; 20% desse total pereceram durante as viagens para as áreas coloniais do Novo Mundo.

A Revolução Industrial, cuja primeira etapa teve início no século XVIII, tornou possível a eliminação do escravismo, já que esse entravava o desenvolvimento capitalista. Agora, tornava-se necessária a ampliação dos mercados para os excedentes de mercadorias gerados pela mecanização da produção e isso só seria possível pela conversão do escravo em trabalhador livre e assalariado.

Ao longo do século XIX, o continente africano tornou-se um privilegiado laboratório natural para pesquisas levadas a efeito por cientistas europeus. Por volta de 1830, o colonialismo ocidental ocupava somente a faixa litorânea do continente, ou seja, aproximadamente 10% de sua superfície total. Contudo, a partir dessa data, a Inglaterra, a França e a Bélgica mostraram interesse em penetrar o continente e ocupar essas regiões. Num primeiro momento, chegaram os exploradores usando como pretexto a curiosidade científica; em seguida, sucessivamente, vieram médicos, missionários religiosos, comerciantes e soldados: tinha início a fase imperialista do capitalismo.

A EXPANSÃO IMPERIALISTA

Mapa - África - Divisão política em 1914

Em 1884-1885 as nações europeias promoveram o Congresso de Berlim com o objetivo de levar a efeito uma partilha pacífica do território africano. Ao contrário do previsto, a delimitação e a fixação das fronteiras das áreas coloniais já conquistadas e das que viriam a ser ocupadas provocaram inúmeros confrontos entre os países imperialistas. Antes da Conferência, apenas 10% do território africano, como já dissemos, estavam sob controle europeu; em poucos anos, a colonização já abrangia 90% dele.

Em 1903, a Inglaterra e a França firmaram a "Entente Cordiale" ("Acordo Amigável"), que dividia o Norte da África entre as duas potências. O Egito e o Sudão caberiam ao Reino Unido, e a França, por seu turno, dominaria a Argélia, a Tunísia e Marrocos, restando a Líbia para o controle imperial italiano.

Quando da eclosão da Primeira Guerra Mundial (1914-18), somente a Abissínia (hoje, Etiópia) e a Libéria (unidade política fundada por negros norte-americanos que retornaram ao continente de origem) tinham permanecido independentes. Logo após o conflito, a Alemanha perdeu suas colônias. A região de Togo caiu em mãos inglesas; Camarões foi dividido entre a Inglaterra e a França; a África Oriental Alemã, sob a denominação de Tanganica, foi incorporada às possessões inglesas. A região sudoeste da África, até então sob controle germânico, passou para ocupação da União Sul-Africana. Entre 1935 e 36, a Abissínia foi tomada pela Itália, compondo, junto com a Somália, a África Oriental Italiana. Independente, agora, somente a Libéria.

No período entre guerras, tiveram início alguns movimentos políticos africanos em prol da independência. Embora ainda modestos, esses esforços levaram as nações ocidentais a criar alguns países africanos formalmente independentes, destacando-se o Egito, protetorado britânico que se declarou independente em 1922, continuando a ser área de influência do Reino Unido. O Canal de Suez, situado em seu território, permaneceu, sob total controle militar britânico. Também a União Sul-Africana, apesar de independente desde 1909, estava integrada na Comunidade Britânica de Nações (Commonwealth), mantendo íntimos laços econômicos com o Reino Unido.

Mapa - Divisão política da África em 1940

A DESCOLONIZAÇÃO

No final da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), o cenário geopolítico do mundo alterou-se: em primeiro lugar, estava definitivamente sepultado o europocentrismo e, agora, o globo se bipolarizara, de um lado o Bloco Ocidental, liderado pelos EUA; de outro o Bloco Comunista, capitaneado pela URSS. Esse conflito Leste versus Oeste, abriu espaço para o surgimento de um novo modelo de nacionalismo: os movimentos de independência das nações até então submetidas ao imperialismo ocidental. Um nacionalismo libertário visando a adoção da autonomia político-econômica, com fortes tintas socializantes  e antiocidentais. Noutros termos, o fenômeno da descolonização, processo relativamente rápido, teve como causas principais:

  • as dificuldades econômicas dos países europeus, agora impossibilitados de manter a ocupação colonial, pois precisavam reconstruir suas economias devastadas pela guerra;
  • o surgimento de movimentos nacionalistas nas áreas coloniais, muitos deles liderados por intelectuais que haviam estudado na Europa e sofrido influência das ideologias democráticas e socialistas;
  • as pressões anticolonialistas, levadas a efeito por políticos e agremiações partidárias da Europa, que defendiam o conceito de que havia uma contradição entre o combate ao nazifascismo, ao longo da Segunda Guerra Mundial, e a preservação de laços coloniais. 

Diversas foram as formas pelas quais se deu o processo de descolonização. As principais podem ser assim resumidas:

- MODELO BRITÂNICO - de início, o Reino Unido se opôs ferozmente aos processos descolonizatórios, enfrentando militarmente os movimentos nacionalistas. O mais destacado exemplo dessa postura inglesa foi o combate às guerrilhas MAU-MAU de Quênia. Também foi essa a atitude britânica quando da independência da Malásia. Percebendo a inutilidade desses esforços, a Inglaterra mudou de postura, passando a promover, de forma controlada, a independência de suas demais áreas coloniais. No final do processo, 15 novas nações, ex-colônias britânicas, nasceram no Continente Africano.

- MODELO FRANCÊS - após oferecer tenaz resistência à independência da Argélia, liderada pela Frente Nacional de Libertação da Argélia (FNLA), a França promoveu a formação da Comunidade Francesa, pela qual as ex-colônias passaram a receber apoio financeiro e técnico.

- MODELO PORTUGUÊS - Portugal, onde prevalecia o autoritarismo político liderado por Antônio Oliveira Salazar, procurou manter suas colônias (Angola, Moçambique, Guiné Bissau e Cabo Verde) militarmente, atolando aquela nação ibérica nas intermináveis guerras coloniais. No dia 25 de abril de 1974, quando a ditadura portuguesa foi derrubada pela "Revolução dos Cravos", liderada pelos capitães e outros jovens oficiais do Movimento das Forças Armadas (MFA), a ascensão de um governo esquerdista em Lisboa possibilitou a independência das áreas coloniais.

- MODELO ESPANHOL - após mais de quatro séculos de ocupação do Marrocos, a Espanha se viu obrigada a enfrentar um movimento de libertação nacional denominado Frente Polisário. Após 2 anos de luta, o governo de Madri abandona quase totalmente a região, mantendo sua presença numa estreita faixa litorânea.

- MODELO BELGA - disposta a não ceder seus territórios no Continente Negro, a Bélgica enfrentou militarmente os movimentos descolonizatórios. Derrotado, o governo de Bruxelas é obrigado a ceder, mas, interessado em criar problemas tribais em suas ex-regiões coloniais, dividiu-as em três países: Zaire, Ruanda e Burundi,  onde convivem duas tribos absolutamente antagônicas, os Tutsis e os Hutus.

Mapa - Movimento de independência na África

OS PROBLEMAS DA DESCOLONIZAÇÃO

Após seus êxitos iniciais, os movimentos nacionalistas africanos logo se viram diante de questões e problemas até hoje insolúveis. Dentre eles, destacam-se:

A ÁFRICA NEGRA, HOJE

UMA TRANSIÇÃO NA DEPENDÊNCIA - embora tenham se libertado do imperialismo clássico (caracterizado pela ocupação militar e administração direta por parte das metrópoles europeias), as novas nações africanas ingressaram numa forma de dominação internacional mais complexa. Hoje, a nova dependência se dá através do controle comercial, empréstimos, crescentes dívidas externas, controle industrial e a introdução de valores culturais ocidentais pelos bancos e empresas transnacionais europeus e norte-americanos. Ou seja, o domínio direto transitou para um controle indireto mais sutil e abrangente.

FRONTEIRAS ARBITRÁRIAS - as fronteiras das atuais nações africanas foram fixadas pelos colonizadores europeus segundo seus exclusivos interesses. Em primeiro lugar, isso gerou a presença, no interior de um mesmo país africano, de formações tribais culturalmente diferenciadas e, quase sempre, inimigas umas das outras. Lamentavelmente, quando do processo de descolonização, a Organização da Unidade Africana (OUA) manteve essas fronteiras, temendo, em caso de alterações, que o caos reinasse sobre o continente. Além disso, os atuais limites são responsáveis por uma enorme fragmentação do espaço territorial, que, na maioria das vezes, impede a emergência de estrutura econômicas mais modernas e eficientes.

UM TRANSPLANTE POLÍTICO: O ESTADO-NAÇÃO - o conceito de Estado nacional, próprio da formação política europeia, é totalmente estranho à mentalidade africana, cujos povos conheciam organizações sociais muito mais simples se comparadas com as do Ocidente. De fato, pouco há em comum entre a tribo africana e o Estado nacional. Essa foi uma imposição europeia às sociedades africanas. Ora, tais Estados artificiais enfrentam inúmeros problemas: etnias distintas agrupadas sob uma mesma organização política e a quase total ausência de uma consciência nacional, que somente atingiu um estágio embrionário durante o período das lutas anticoloniais. Em suma, os atuais países da África Negra são vítimas da ação de duas forças absolutamente opostas: de um lado, um aparelho de Estado "transplantado", de cunho modernizador e centralizador; de outro, uma estrutura tribal arcaica e particularista.

A AUSÊNCIA DE QUADROS BUROCRÁTICOS EFICIENTES - a administração de Estados modernos exige uma burocracia competente, numerosa e com sofisticada formação técnica e intelectual. Quando do imperialismo, o gerenciamento político-administrativo das nações africanas era levado a efeito por administradores europeus, sendo a participação africana rara e superficial. Com a independência, os africanos herdaram Estados complexos e organizados em moldes ocidentais, com os quais haviam tido pouco contato. Se, por um lado, as elites africanas, que encabeçaram o processo de autonomia, eram educadas na Europa e nos EUA, elas eram pouco numerosas, não havendo quadros para os escalões administrativos secundários. Em termos mais simples: se os primeiros líderes e seus assessores próximos eram bastante preparados, os cargos administrativos de segundo e terceiro níveis eram preenchidos por pessoas desconhecedoras das regras básicas da administração moderna, gerando um abismo entre os componentes do primeiro escalão e os demais quadros burocráticos. Isso tudo gerou a inoperância, a endêmica corrupção, o burocratismo e o caos administrativo, como consequência, o cenário político africano vem sendo marcado por lutas tribais e sucessivos golpes de Estado, quase sempre interligados às diferenças étnicas.  

Sumário

- A Organização Social Tradicional da África Negra
- A Moderna Colonização Europeia
- A Expansão Imperialista
- A Descolonização
- Os Problemas da Descolonização
- A África Negra, hoje

Áreas exclusivas para assinantes