Governo Médici

O governo Médici foi um período da ditadura militar no Brasil que ocorreu entre 1969 e 1974, durante o qual o general Emílio Garrastazu Médici foi o presidente do país. Esse período é frequentemente referido como o "milagre econômico", já que o Brasil experimentou um rápido crescimento econômico e industrial, com taxas de crescimento do PIB superiores a 10% ao ano em alguns casos.

Entretanto, o governo Médici também é conhecido por ser um dos mais repressivos e autoritários da história do Brasil. Durante esse período, a censura à imprensa e às artes se intensificou, e a repressão política foi brutal, com a perseguição, tortura e assassinato de opositores ao regime. O Ato Institucional nº 5 (AI-5), que havia sido promulgado em 1968, concedeu ao governo poderes extraordinários, permitindo a suspensão de direitos políticos, prisão de críticos e fechamento do Congresso Nacional.

A Operação Bandeirante (OBAN) e o DOI-CODI, órgãos criados para combater a oposição, foram responsáveis por inúmeras violações de direitos humanos. A Comissão Nacional da Verdade, estabelecida em 2012, investigou os crimes cometidos durante a ditadura e atribuiu centenas de mortes e desaparecimentos forçados ao regime militar, muitos deles ocorridos sob o governo Médici.

Com o fim do governo Médici em 1974, o Brasil passou por um processo de abertura política lento e gradual, conhecido como "distensão", até que finalmente retornou à democracia na década de 1980.

O Ministério do Presidente Médici

O governo do presidente Emílio Garrastazu Médici manteve alguns ministros dos governos anteriores, como parte de uma estratégia de continuidade política e estabilidade no regime militar. Entre os ministros mais notáveis do governo Médici, encontramos Antônio Delfim Netto, que foi mantido no cargo de Ministro da Fazenda. Delfim Netto foi uma figura central na formulação e implementação das políticas econômicas durante o chamado "milagre econômico", promovendo a industrialização e investimentos em infraestrutura.

Durante o governo do presidente Emílio Garrastazu Médici, o general João Batista Figueiredo serviu como Chefe da Casa Militar. A Casa Militar é um órgão que auxilia o presidente em questões relacionadas à defesa nacional e segurança interna. Figueiredo exerceu essa função de 1969 a 1974, durante todo o mandato de Médici.

Posteriormente, no governo do presidente Ernesto Geisel (1974-1979), Figueiredo foi nomeado Chefe do Serviço Nacional de Informações (SNI), o órgão de inteligência criado pelo regime militar para coordenar atividades de espionagem e repressão política.

Figueiredo desempenhou um papel importante na política de segurança nacional e na repressão aos opositores do regime durante seu tempo no governo Médici e no SNI. Ele foi escolhido como sucessor de Geisel e se tornou presidente do Brasil em 1979, sendo o último general a governar o país durante a ditadura militar. Seu governo (1979-1985) foi marcado pelo processo de abertura política e a transição gradual para a democracia, conhecida como a "distensão".

Outros ministros também foram mantidos ou nomeados durante o governo Médici, em áreas como educação, justiça e relações exteriores. Essa continuidade ministerial ajudou o governo a implementar suas políticas de forma mais eficiente e a manter a estabilidade dentro do regime autoritário.

Características do Governo Médici

O governo Médici é frequentemente lembrado por diversos aspectos que marcaram o período entre 1969 e 1974:

Milagre econômico: Durante o governo Médici, o Brasil experimentou um rápido crescimento econômico e industrial, impulsionado por políticas de desenvolvimento e investimentos em infraestrutura. As taxas de crescimento do PIB chegaram a ser superiores a 10% ao ano em alguns casos, e esse período ficou conhecido como o "milagre econômico". O ministro da Fazenda, Antônio Delfim Netto, desempenhou um papel central na condução dessas políticas econômicas.

Brasil potência: O "milagre econômico" alimentou um sentimento nacionalista e a ideia de um "Brasil potência". O governo promoveu essa imagem por meio de propaganda e projetos grandiosos, como a construção de usinas hidrelétricas e a expansão das rodovias, visando a transformar o país em uma potência econômica e política.

Grandes obras: O governo Médici investiu em grandes obras de infraestrutura, como a construção da Rodovia Transamazônica, a Usina Hidrelétrica de Itaipu (em parceria com o Paraguai) e a Ponte Rio-Niterói. Essas obras contribuíram para o desenvolvimento do país, mas também geraram críticas quanto aos seus impactos sociais e ambientais.

Tricampeonato mundial de futebol: Em 1970, o Brasil conquistou seu terceiro título mundial na Copa do Mundo de Futebol no México, com uma equipe talentosa e icônica que incluía jogadores como Pelé, Tostão, Jairzinho e Rivelino. O tricampeonato serviu como um elemento de orgulho nacional e foi utilizado pelo governo militar como propaganda para fortalecer a imagem do Brasil como uma nação vitoriosa e próspera.

Terrorismo e violência política

O governo Médici foi marcado por diferentes formas de terrorismo e violência política, envolvendo tanto o regime militar quanto grupos de esquerda e direita. Após a promulgação do AI-5 em 1968, a repressão política se intensificou e as liberdades civis foram ainda mais restringidas, o que acabou por levar a uma escalada na violência.

De um lado, o governo militar e órgãos de repressão, como a Operação Bandeirante (OBAN) e o DOI-CODI, perseguiram, torturaram e mataram opositores políticos. Por outro lado, grupos de esquerda recorreram à luta armada como forma de resistência ao regime, já que as vias pacíficas de oposição haviam sido praticamente eliminadas.

O PCB (Partido Comunista Brasileiro) optou por não aderir à luta armada, acreditando que essa estratégia apenas serviria para justificar uma reação ainda mais violenta por parte do regime. Entretanto, vários grupos dissidentes se separaram do PCB e formaram organizações armadas para combater a ditadura militar. Algumas das organizações mais conhecidas incluem:

PC do B (Partido Comunista do Brasil)

MNR (Movimento Nacionalista Revolucionário)

MRT (Movimento Revolucionário Tiradentes)

ALN (Ação Libertadora Nacional), liderada por Carlos Marighella

VPR (Vanguarda Popular Revolucionária), liderada por Carlos Lamarca

MR-8 (Movimento Revolucionário 8 de Outubro)

Essas organizações realizaram sequestros, assaltos, atentados e outras ações armadas contra o regime, embora com pouca efetividade em termos de mudança política. A violência resultante dessa escalada contribuiu para o clima de medo e repressão que caracterizou o governo Médici e a ditadura militar como um todo.

Apesar do grande número de organizações guerrilheiras durante o governo Médici, havia relativamente poucos membros ativos em suas fileiras, estimados em aproximadamente 1.000 em todo o Brasil. De fato, esses grupos frequentemente adotavam uma postura mais elitista e não conseguiram angariar um amplo apoio popular. Essa falta de apoio e a natureza fragmentada das organizações contribuíram para a ineficácia da guerrilha urbana.

A guerrilha no Brasil enfrentou divisões internas, com diferentes grupos adotando estratégias e táticas variadas e, em alguns casos, até mesmo se opondo uns aos outros. Essa falta de unidade enfraqueceu a resistência armada à ditadura militar. Carlos Marighella e Carlos Lamarca foram dois dos líderes mais famosos e emblemáticos da guerrilha no Brasil durante o governo Médici.

Carlos Marighella, um ex-deputado federal, foi o fundador e principal líder da Ação Libertadora Nacional (ALN), uma das maiores organizações guerrilheiras no Brasil na época. Marighella escreveu o "Minimanual do Guerrilheiro Urbano", um guia para a luta armada no ambiente urbano. Ele foi morto em uma emboscada realizada pelas forças de segurança em 1969.

Carlos Lamarca, ex-capitão do Exército Brasileiro, foi um dos líderes da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR). Ele desertou do Exército e se juntou à guerrilha em 1969, tornando-se uma das figuras mais procuradas pelas forças de segurança. Lamarca foi morto em 1971 em uma operação das forças de segurança no interior da Bahia.

Como o PCB havia previsto, a luta armada por parte da esquerda acabou servindo como justificativa para o regime militar intensificar a repressão e estabelecer um dos sistemas de controle e vigilância mais violentos e abrangentes da história brasileira. A "comunidade de segurança" mencionada englobava uma rede de agentes, informantes e colaboradores espalhados por todo o país, atuando em órgãos como o Serviço Nacional de Informações (SNI), a Operação Bandeirante (OBAN) e o DOI-CODI.

A repressão violenta do regime militar, combinada com as divisões internas e a falta de apoio popular generalizado, levou à rápida desarticulação e derrota da guerrilha. A maioria das organizações guerrilheiras foi efetivamente desmantelada em um período de dois a três anos, com muitos de seus membros presos, mortos ou desaparecidos.

O colapso do “milagre econômico”

O "milagre econômico" brasileiro, que caracterizou grande parte do governo Médici, começou a mostrar sinais de desgaste nos últimos anos do seu governo. Apesar de as taxas de crescimento ainda serem altas, outros indicadores econômicos apontavam para o fim desse período de rápida expansão.

A inflação, que havia sido mantida sob controle durante a maior parte do "milagre econômico", começou a ressurgir no final do governo Médici. Essa inflação crescente foi resultado de diversos fatores, incluindo gastos públicos excessivos, aumento dos salários sem a correspondente produtividade e desequilíbrios na balança comercial.

Além disso, a crise do petróleo de 1973 teve um impacto significativo na economia brasileira. O choque dos preços do petróleo aumentou os custos de produção e importação, exacerbando os problemas inflacionários. O Brasil, que dependia fortemente de importações de petróleo, foi duramente atingido pela crise e, como resultado, começou a enfrentar dificuldades econômicas.

A partir de 1974, as taxas de crescimento econômico do Brasil começaram a diminuir, marcando o início do fim do "milagre econômico". Essa desaceleração persistiu durante os governos subsequentes, e a economia brasileira passou por um período de instabilidade e estagnação, agravado por uma dívida externa crescente e altas taxas de inflação.

Apesar do crescimento econômico significativo durante o "milagre brasileiro", houve consequências negativas associadas a esse período. A dívida externa do Brasil cresceu consideravelmente, em parte devido aos empréstimos tomados para financiar projetos de infraestrutura e desenvolvimento industrial. Esse endividamento deixou o país vulnerável a crises econômicas e flutuações nos mercados internacionais.

Além disso, a distribuição de renda no Brasil piorou durante esse período. A desigualdade econômica aumentou, e a concentração de renda se agravou, com uma parcela significativa da população permanecendo na pobreza. A famosa frase do general Médici, "o País vai bem, mas o povo vai mal", reflete essa situação de desigualdade e a disparidade entre o crescimento econômico e o bem-estar da população em geral.

No entanto, é importante notar que a classe média brasileira experimentou melhorias em seu padrão de vida durante o "milagre econômico". O acesso a bens de consumo, como automóveis e eletrodomésticos, tornou-se mais fácil, e houve um aumento nos investimentos em educação e saúde. Ainda que a participação percentual da classe média na renda nacional não tenha aumentado significativamente, a qualidade de vida dessa parcela da população melhorou em comparação com períodos anteriores. Essas melhorias na classe média, no entanto, não se traduziram em avanços significativos para a população mais pobre do país, que continuou enfrentando condições precárias e desigualdades socioeconômicas.

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