Governo Geisel
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O governo do General Ernesto Geisel (1974-1979) foi o quarto governo do período militar no Brasil, sucedendo ao governo do General Emílio Médici. Geisel assumiu a presidência em um contexto de desafios econômicos e crescente insatisfação política, com o "milagre econômico" chegando ao fim e a sociedade brasileira pressionando por mudanças políticas e pelo fim do regime militar.
Durante o governo Geisel, houve uma mudança gradual na política interna, conhecida como distensão, que visava a uma abertura política lenta e controlada, com o objetivo de relaxar a repressão e permitir uma maior liberdade de expressão e de imprensa. No entanto, essa abertura foi acompanhada por uma política de "abertura lenta, gradual e segura", que buscava garantir que o poder permanecesse nas mãos dos militares e evitar o retorno ao caos político pré-1964.
Ernesto Geisel enfrentou uma série de desafios econômicos durante seu governo. A crise do petróleo de 1973 afetou a economia brasileira, que dependia fortemente das importações de petróleo. Além disso, a inflação aumentou e a dívida externa continuou a crescer, o que levou a uma desaceleração do crescimento econômico. Para combater esses problemas, Geisel adotou uma política de "pragmatismo econômico" e buscou diversificar a matriz energética do Brasil, investindo em fontes alternativas de energia, como a hidrelétrica e a nuclear.
No campo das relações exteriores, o governo Geisel adotou uma política externa mais independente, conhecida como "pragmatismo ecumênico e responsável". Essa política envolveu a busca por relações diplomáticas e comerciais mais diversificadas e a defesa dos interesses nacionais, mesmo que isso significasse desafiar as posições de países mais poderosos, como os Estados Unidos.
Ernesto Geisel - novo presidente do Brasil
O General Ernesto Geisel foi anunciado como o novo presidente do Brasil em junho de 1973. Sua nomeação foi, em parte, resultado da influência de seu irmão, o General Orlando Geisel, que era Ministro do Exército durante o governo Médici. A escolha de Ernesto Geisel foi fruto de um processo de negociação e debate entre as lideranças militares, que buscavam um candidato com perfil moderado e habilidade para enfrentar os desafios políticos e econômicos que o país enfrentava na época.
Ernesto Geisel possuía uma sólida carreira militar e administrativa, tendo sido chefe da Casa Militar durante o governo de Castelo Branco e presidente da Petrobrás, a estatal brasileira de petróleo. Essas posições de liderança e sua experiência no setor de energia foram consideradas importantes para enfrentar os desafios econômicos do Brasil, especialmente em relação à crise do petróleo que havia se iniciado em 1973.
Além disso, a proximidade entre os irmãos Geisel permitiu que Ernesto contasse com o apoio de Orlando durante seu governo, especialmente em questões relacionadas ao Exército e à segurança nacional. A indicação de Ernesto Geisel como presidente foi, portanto, fruto de uma combinação de fatores, incluindo sua experiência, perfil moderado e as conexões políticas e militares proporcionadas por seu irmão Orlando.
Ernesto Geisel demonstrou uma liderança forte e autoritária durante seu governo, exercendo maior poder pessoal do que outros generais presidentes. Essa força pode ser atribuída a diversos fatores, incluindo sua experiência e habilidades administrativas, seu perfil moderado e a influência de seu irmão, o General Orlando Geisel.
Geisel buscou consolidar seu poder ao impor sua autoridade a diferentes órgãos do Estado, inclusive às Forças Armadas. Ele enfrentou desafios e resistências por parte de setores mais radicais do regime militar, especialmente em relação ao processo de distensão e abertura política. No entanto, Geisel conseguiu impor sua vontade em diversos assuntos, promovendo mudanças significativas na política interna e externa do Brasil durante seu governo.
Um exemplo dessa autoridade foi o afastamento de figuras importantes do regime que se opunham às suas políticas. Geisel também enfrentou a chamada "linha dura" do regime - um grupo de oficiais militares que defendia a manutenção da repressão e se opunha à abertura política. Ao enfrentar essas resistências e promover mudanças, Geisel demonstrou sua capacidade de exercer controle e autoridade sobre o governo e as Forças Armadas.
A abertura política
Quando Ernesto Geisel assumiu a presidência em 1974, o Brasil enfrentava uma série de desafios políticos, econômicos e sociais. A economia brasileira, que anteriormente experimentava um período de rápido crescimento conhecido como o "milagre econômico", começava a se deteriorar. A crise do petróleo de 1973, o aumento da inflação e a crescente dívida externa contribuíram para essa desaceleração econômica.
A sociedade civil estava insatisfeita com o longo regime militar e a falta de liberdade política. A repressão e a censura haviam sufocado a oposição e limitado a liberdade de expressão, gerando descontentamento generalizado entre a população. Além disso, a desigualdade social e a concentração de renda haviam aumentado durante o período do "milagre econômico", contribuindo ainda mais para a insatisfação social.
As próprias Forças Armadas enfrentavam um desgaste devido à longa permanência no poder. Havia divisões internas entre facções mais moderadas, que apoiavam uma transição gradual para a democracia, e a chamada "linha dura", que defendia a continuidade da repressão e do regime militar. Essas divisões e o desgaste do regime tornavam a governabilidade mais complexa.
O governo Geisel percebeu a necessidade de mudança para evitar uma insatisfação generalizada e a possível queda do regime militar. A solução encontrada foi promover uma abertura política gradual e controlada, permitindo maior liberdade política e reduzindo a repressão, mas mantendo o grupo dominante no poder.
Essa abertura política, conhecida como distensão, envolveu uma série de medidas, incluindo a redução da repressão policial, a liberalização do sistema eleitoral, a formação de novos partidos políticos, a flexibilização da censura à imprensa e a suspensão de alguns atos institucionais. Mais tarde, durante o governo de João Figueiredo, a anistia aos presos políticos também foi concedida.
No entanto, essa abertura política não representou uma completa redemocratização do Brasil, pois o grupo dominante buscava manter o controle do poder e evitar a entrega do governo à oposição. O processo de distensão foi realizado de forma "lenta, gradual e segura" para garantir a manutenção das características essenciais do regime militar e evitar um retorno ao caos político pré-1964.
O projeto de abertura política durante o governo Geisel enfrentou resistências significativas, especialmente por parte dos elementos da "linha dura" dentro do regime militar. Esses grupos defendiam a continuidade da repressão e se opunham a qualquer forma de liberalização política. Como resultado, o processo de distensão foi conduzido de forma cautelosa e, às vezes, contraditória, alternando medidas de liberalização com ações repressivas.
O presidente Geisel utilizou o AI-5 (Ato Institucional no. 5) em diversas ocasiões para controlar a oposição e garantir a continuidade do regime. Isso incluiu a cassação de mandatos de políticos e a adoção de medidas eleitorais para favorecer a Arena (Aliança Renovadora Nacional) - o partido de sustentação do regime. A intenção era garantir o sucesso eleitoral da Arena e impedir o avanço da oposição, representada principalmente pelo MDB (Movimento Democrático Brasileiro).
Em abril de 1977, enfrentando uma crise política em relação a uma reforma no sistema eleitoral, Geisel fechou o Congresso temporariamente e, por meio do Ato Institucional no. 23, decretou uma série de medidas, incluindo a reforma do Judiciário e a instituição de eleições indiretas para governadores. Essa ação, conhecida como o "Pacote de Abril", foi um exemplo de como Geisel recorria a medidas autoritárias para manter o controle e conter a oposição.
As eleições legislativas de novembro de 1974
As eleições legislativas de novembro de 1974 ocorreram em um contexto de maior liberdade política em comparação aos anos anteriores, graças ao processo de distensão iniciado pelo governo Geisel. Durante essa eleição, o MDB (Movimento Democrático Brasileiro), partido de oposição ao regime militar, experimentou um crescimento eleitoral significativo, o que foi interpretado como um sinal do crescente descontentamento da população com o regime e um anseio por mudanças políticas.
O MDB conseguiu ampliar sua bancada na Câmara Federal e obter uma vitória expressiva no Senado, elegendo mais da metade dos senadores em disputa. Esse resultado surpreendente foi uma demonstração de que, mesmo com as limitações impostas pelo regime, a oposição estava ganhando força e a sociedade brasileira buscava maior pluralidade política.
As eleições de 1974 foram um marco importante no processo de abertura política do Brasil, pois mostraram que a população estava disposta a apoiar a oposição e exigir mudanças no sistema político. Esse resultado também serviu como um indicativo para o governo Geisel de que a distensão deveria continuar, ainda que de forma cautelosa e gradual, para evitar uma crise política e social ainda maior no país.
Violência e repressão no Governo Geisel
A morte de Vladimir Herzog, um proeminente jornalista e diretor de jornalismo da TV Cultura na época, foi um evento marcante na história do Brasil durante o período da ditadura militar. Herzog foi preso e torturado até a morte pelos agentes do DOI-CODI em outubro de 1975, sob a acusação de ser membro do Partido Comunista Brasileiro.
A versão oficial apresentada pelo governo era que Herzog havia cometido suicídio. No entanto, o laudo médico e o fato de ele ter sido encontrado enforcado com o cinto de seu próprio macacão, o qual era curto demais para ser usado para se enforcar, geraram desconfiança, e a versão oficial foi amplamente desacreditada.
Apesar das ameaças do regime militar, a morte de Herzog galvanizou a resistência contra o governo autoritário. No dia 31 de outubro de 1975, uma missa ecumênica foi realizada na Catedral da Sé, em São Paulo, em memória de Herzog. Esta missa foi assistida por cerca de 8.000 pessoas, apesar das tentativas do governo de reprimir o evento.
A missa ecumênica foi um evento inter-religioso muito significativo na luta contra a ditadura militar no Brasil. Essa cerimônia foi liderada pelo então Arcebispo de São Paulo, Cardeal Dom Paulo Evaristo Arns, e contou também com a participação de lideranças de outras religiões, como o rabino Henry Sobel.
Henry Sobel foi um rabino importante no Brasil e um forte defensor dos direitos humanos. Ele também se manifestou contra a versão oficial do suicídio de Vladimir Herzog. Além disso, desafiou a versão oficial do governo militar ao se recusar a realizar o funeral de Herzog no setor do cemitério judaico destinado aos suicidas.
A participação do rabino Henry Sobel na cerimônia ecumênica juntamente com o Cardeal Arns foi um forte sinal de solidariedade e resistência ao regime militar. Milhares de pessoas, incluindo políticos, jornalistas, ativistas de direitos humanos e cidadãos comuns, compareceram ao evento, apesar das tentativas do governo de reprimi-lo. A morte de Herzog é vista como um dos pontos de virada na luta contra a ditadura militar no Brasil.
A morte do operário metalúrgico Manuel Fiel Filho em janeiro de 1976, sob circunstâncias muito semelhantes à morte de Vladimir Herzog, desencadeou uma crise no governo militar. Fiel Filho foi preso pelo DOI-CODI sob suspeita de ligação com atividades subversivas e, assim como Herzog, a versão oficial era de que ele teria cometido suicídio em sua cela.
Essa morte foi um marco importante na história do Brasil, pois contribuiu para acelerar as mudanças no comando do II Exército e também aumentou a pressão internacional sobre o governo brasileiro. O presidente Ernesto Geisel, que estava promovendo uma política de "distensão gradual e segura" para afastar o país do autoritarismo, ficou particularmente perturbado com a morte de Fiel Filho, pois representou uma afronta direta à sua autoridade e à política que estava tentando implementar.
Consequentemente, Geisel demitiu o general Ednardo D'Ávila Mello do comando do II Exército e o substituiu por um oficial de sua confiança, o general Dilermando Gomes Monteiro, em um movimento claro para reafirmar seu controle sobre o Exército e reprimir os setores mais radicais do regime militar. Este foi um passo significativo no processo de abertura política do Brasil, conhecido como "abertura lenta, gradual e segura", que culminou no fim da ditadura militar em 1985.
Contudo, mesmo com o início da "distensão lenta, gradual e segura" durante o governo de Ernesto Geisel, a violência e a repressão continuaram. O que se seguiu foi uma onda de atividade clandestina da extrema direita, que desencadeou uma série de ataques e atos de terror, visando principalmente a políticos da oposição, mas também a jornais, editoras e políticos conservadores que não eram vistos como suficientemente alinhados com a visão da extrema direita. Essa foi uma manifestação do que se tornou conhecido como a fase do "terrorismo de direita" no Brasil.
Uma das organizações mais conhecidas envolvidas nessas ações foi a Aliança Anticomunista Brasileira, também conhecida como "Comando de Caça aos Comunistas" (CCC). Essas organizações foram formadas por militares de extrema direita, ex-integrantes dos órgãos de repressão e grupos paramilitares que buscavam combater o que viam como uma crescente influência comunista.
Esses eventos destacaram a complexidade do processo de transição para a democracia no Brasil. Enquanto Geisel buscava abrandar o regime e começar a transição para a democracia, ele ainda enfrentava uma intensa oposição tanto de dentro como de fora do seu governo, o que retardou o processo de abertura. Ao mesmo tempo, a continuidade da repressão e o surgimento do "terrorismo de direita" foram lembretes contundentes da persistente influência e presença dos militares e da extrema direita na política brasileira.
A Lei Falcão
A Lei Falcão, aprovada em 1976, foi uma medida restritiva adotada pelo governo Geisel em resposta ao sucesso eleitoral do MDB nas eleições de 1974. Elaborada pelo então Ministro da Justiça, Armando Falcão, a lei tinha como objetivo limitar o acesso dos candidatos à rádio e televisão durante as campanhas eleitorais. A legislação restringia a propaganda eleitoral na televisão e no rádio a apenas apresentar o nome e o número do candidato, sem discursos ou debates. Isso dificultava a exposição dos candidatos da oposição e favorecia a Arena, partido de apoio ao regime.
Embora essa lei representasse um retrocesso em relação à abertura política, Geisel também deu passos no sentido de reduzir a atuação dos órgãos de segurança dedicados à repressão. Durante o seu mandato, o governo começou a controlar melhor os agentes da repressão e a diminuir a violência política. Essas ações, apesar de não terem eliminado completamente a repressão, sinalizavam uma mudança na postura do regime em relação às violações de direitos humanos e à repressão política.
A Lei Falcão e a redução da repressão são exemplos de como o governo Geisel procurava equilibrar a manutenção do regime militar com a necessidade de abrir o sistema político. Essa abordagem contraditória e cautelosa foi uma característica marcante do processo de distensão durante o governo Geisel.
O Pacote de Abril
Em 1977, o MDB, partido de oposição, conseguiu rejeitar no Congresso Nacional um projeto de reforma judiciária apresentado pelo governo Geisel. A reação do governo a essa derrota foi fechar temporariamente o Congresso e aprovar a reforma por decreto, além de editar o chamado Pacote de Abril, que consistia em um conjunto de medidas eleitorais destinadas a fortalecer a posição do regime no poder.
Uma das medidas mais controversas do Pacote de Abril foi a instituição do "senador biônico". Até então, a Constituição previa que cada estado brasileiro elegeria três senadores por voto popular direto. Com a introdução dos senadores biônicos, um dos três senadores passou a ser escolhido por um Colégio Eleitoral, no qual a Arena, partido de apoio ao regime, tinha maioria garantida. Dessa forma, o governo controlava a escolha desse senador indiretamente, assegurando que ele fosse alinhado com os interesses do regime.
A criação dos senadores biônicos representou um retrocesso na abertura política e uma tentativa de manter o controle do regime militar sobre o processo político. A medida foi amplamente criticada e vista como uma maneira de enfraquecer a oposição e limitar a democracia no país. No entanto, apesar desses obstáculos, o processo de abertura política continuou de forma gradual e cautelosa durante o governo Geisel, abrindo caminho para a redemocratização do Brasil nas décadas seguintes.
Manifestações da sociedade civil
Enquanto o governo Geisel tentava equilibrar a manutenção do regime militar com medidas de abertura política, a sociedade civil brasileira começou a se manifestar e exigir mudanças. Diversos setores da sociedade se mobilizaram, pressionando o governo por maior liberdade e direitos.
A imprensa, que sofria com a censura durante o regime militar, começou a se libertar, publicando notícias e opiniões críticas ao governo e aos militares. Essa maior liberdade de expressão permitiu que a população tivesse acesso a informações que antes eram controladas pelo regime, contribuindo para a conscientização política e social.
O movimento estudantil, que havia sido duramente reprimido nos anos anteriores, começou a se reorganizar, retomando seu papel de protagonista na luta pela democracia. Os estudantes se reuniam para debater e protestar contra o regime e suas políticas.
Os sindicatos também se fortaleceram, pressionando o governo com greves e reivindicações por melhores salários e mudanças nas leis sindicais. Essas ações sindicais desafiavam o controle do governo sobre os trabalhadores e sinalizavam o crescente descontentamento da classe trabalhadora com o regime.
A classe média brasileira, que havia apoiado o regime militar durante o "milagre econômico", também começou a expressar insatisfação com o governo. Manifestações e passeatas contra o governo ocorreram em várias cidades, evidenciando o crescente desejo de mudança política e social.
Essas manifestações da sociedade civil refletiam o descontentamento generalizado com o regime militar e a demanda por maior liberdade e democracia. Esse movimento ajudou a impulsionar o processo de abertura política e, eventualmente, a redemocratização do Brasil.
A insatisfação popular com o regime militar ficou ainda mais evidente nas eleições de 1978 para senadores, deputados federais e deputados estaduais. Apesar das medidas restritivas impostas pelo governo, como a Lei Falcão e o Pacote de Abril, o MDB (partido de oposição) conseguiu obter resultados eleitorais expressivos, praticamente igualando-se à Arena em votos e até superando-a na eleição para o Senado.
No entanto, a legislação eleitoral elaborada pelo governo e as medidas do Pacote de Abril ainda favoreciam a Arena, resultando em uma distorção entre o número de votos e a representação no Congresso. Com apenas 1% a mais de votos que o MDB, a Arena elegeu 10% mais deputados e 100% mais senadores.
Mesmo com essa desigualdade na representação política, a crescente insatisfação popular e o sucesso eleitoral do MDB enviaram uma mensagem clara ao regime de que era necessário avançar no processo de abertura política. Em resposta, o governo Geisel deu continuidade à abertura e, no início de 1979, revogou o Ato Institucional no. 5 (AI-5), que havia sido um dos principais instrumentos de repressão política durante o regime militar.
A revogação do Ato Institucional no. 5 (AI-5) marcou um passo importante no processo de abertura política do Brasil. O AI-5, implementado em 1968, concedia poderes extraordinários ao presidente e foi responsável por intensificar a repressão política e a censura durante a Ditadura Militar. A revogação deste ato foi um sinal de que o regime estava comprometido em retomar o caminho da democracia. No entanto, ainda havia um longo caminho a percorrer antes que o país pudesse consolidar seu processo de redemocratização.
A política econômica do governo Geisel
O governo Geisel enfrentou diversos desafios econômicos durante seu mandato, em parte devido ao fim do "milagre brasileiro" e à herança do governo Médici. Ao invés de adotar políticas econômicas ajustadas à nova realidade, o governo Geisel insistiu em manter altas taxas de crescimento e investir em projetos ambiciosos e onerosos.
Essa política econômica levou o Brasil a recorrer a empréstimos externos para financiar seu crescimento e projetos, mesmo sem ter condições de pagar os empréstimos anteriores. Como resultado, a dívida externa brasileira aumentou significativamente durante o governo Geisel, passando de 15 bilhões de dólares para 43 bilhões de dólares em apenas cinco anos.
Além disso, a inflação no Brasil cresceu de forma preocupante durante o governo Geisel, passando de 20% para 40% ao ano. Esse aumento erodiu o poder de compra da população e contribuiu para o descontentamento com o governo e o regime militar.
Esses problemas econômicos, somados às demandas por maior liberdade política e democracia, desafiaram o governo Geisel e foram fatores importantes no processo de abertura política e na futura redemocratização do Brasil.
A situação econômica do Brasil durante o governo Geisel foi agravada pela natureza autoritária do regime militar. As principais decisões econômicas eram tomadas por um pequeno grupo de tecnocratas, sem a participação ou a consulta da sociedade civil. Essa falta de transparência e de envolvimento público nos processos decisórios contribuiu para a execução equivocada de diversos projetos.
Muitos desses projetos acabaram sendo abandonados pela metade, o que levou ao desperdício de bilhões de dólares e ao agravamento da crise econômica. A combinação do caráter autoritário do governo, da falta de participação da sociedade civil na tomada de decisões e da má gestão de recursos acabou por deteriorar ainda mais a situação econômica do país.
O Programa Nacional do Álcool (Proálcool)
O governo Geisel cometeu erros de planejamento, e um exemplo disso foi a implementação do Programa Nacional do Álcool (Proálcool), lançado em 1975. O objetivo principal do programa era substituir parte do consumo de gasolina por álcool combustível, produzido a partir da cana-de-açúcar, como uma resposta à crise do petróleo e ao aumento dos preços internacionais desse insumo a partir de 1973.
O Proálcool conseguiu, em parte, atingir seu objetivo de reduzir a dependência do país em relação à gasolina, especialmente com a introdução de veículos movidos a álcool nos anos 1980. No entanto, o programa não foi eficiente na redução do consumo de óleo diesel e óleo combustível, que também são derivados do petróleo e representavam uma parcela significativa das importações do país.
Além disso, a execução do programa enfrentou diversos problemas, como investimentos insuficientes em pesquisa e desenvolvimento, a falta de incentivos adequados para a produção de cana-de-açúcar e álcool e a oscilação dos preços do petróleo no mercado internacional, o que afetou a competitividade do álcool como combustível alternativo.
Devido a esses fatores, o Proálcool não conseguiu resolver completamente a questão da dependência do Brasil em relação às importações de petróleo, e o país continuou a enfrentar desafios na gestão de sua matriz energética e no equilíbrio de suas contas externas.
O acordo nuclear entre Brasil e Alemanha Ocidental
O acordo nuclear entre Brasil e Alemanha Ocidental foi assinado em 1975, durante o governo do general Ernesto Geisel. O objetivo do acordo era fornecer ao Brasil a tecnologia necessária para desenvolver um programa nuclear de geração de energia elétrica. A cooperação incluía a construção de usinas nucleares e a transferência de tecnologia para enriquecimento de urânio e reprocessamento de combustível nuclear.
A usina nuclear Angra II, localizada em Angra dos Reis (RJ), foi um dos principais projetos decorrentes do acordo nuclear Brasil-Alemanha. Entretanto, a construção dessa usina enfrentou diversos problemas e atrasos, levando mais de 20 anos para ser concluída. Angra II começou a ser construída em 1976 e só entrou em operação comercial em 2001.
Além disso, a tecnologia adquirida por meio do acordo já estava ficando obsoleta na época e, devido a uma série de fatores, como falta de investimentos, mudanças no contexto político e econômico internacional e preocupações ambientais e de segurança, o programa nuclear brasileiro não conseguiu alcançar os objetivos inicialmente propostos.
O acordo nuclear Brasil-Alemanha acabou sendo alvo de críticas por parte da sociedade civil e da comunidade internacional, principalmente em relação à transparência, aos altos custos envolvidos e aos impactos ambientais e de segurança associados à geração de energia nuclear.
A sucessão presidencial
O episódio envolvendo o general Sílvio Frota ocorreu durante o governo de Ernesto Geisel, no contexto da abertura política e da sucessão presidencial. Frota, então Ministro do Exército e membro da chamada "linha dura", foi lançado como candidato à presidência por um grupo de deputados da Arena, o partido de apoio ao regime militar.
Geisel não apoiava a candidatura de Frota, pois queria continuar com seu projeto de abertura política, e a "linha dura" representava uma postura mais repressiva e autoritária. Diante da situação, o presidente decidiu demitir Frota do cargo de Ministro do Exército em outubro de 1977.
Sílvio Frota tentou resistir à demissão e convocou uma reunião do Alto Comando no Ministério do Exército, numa tentativa de conseguir apoio para permanecer no cargo ou até mesmo dar um golpe. No entanto, o general Hugo Abreu, chefe da Casa Militar e aliado de Geisel, conseguiu convencer os membros do Alto Comando a se reunirem com o presidente ao invés de Frota.
Essa atitude foi crucial para evitar o agravamento da crise e um possível golpe. Geisel manteve a autoridade, e a demissão de Frota foi confirmada. O episódio revelou as tensões e divisões internas dentro das Forças Armadas durante o processo de abertura política e marcou um ponto de virada na transição do regime militar para a redemocratização do Brasil.
O presidente Ernesto Geisel anunciou a escolha do general João Figueiredo como seu sucessor. Figueiredo, que atuava como chefe do Serviço Nacional de Informações (SNI) e ex-chefe da Casa Militar do governo Médici, era uma figura controversa. A indicação de Figueiredo não foi bem recebida por todos os membros do regime, incluindo o general Hugo Abreu, que acabou sendo demitido do cargo por discordar da escolha.
Enquanto isso, o Movimento Democrático Brasileiro (MDB) tentou articular a candidatura do general da reserva Euler Bentes Monteiro para a presidência. Entretanto, a iniciativa não teve sucesso, e Figueiredo assumiu a presidência do Brasil em 1979.
Quando o general João Baptista de Oliveira Figueiredo assumiu a presidência em março de 1979, ele herdou o desafio de continuar o processo de abertura política iniciado por seu antecessor, Ernesto Geisel. Figueiredo tinha como objetivo ampliar a abertura e garantir uma transição pacífica para a democracia.
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