Islamismo

Islamismo

O islamismo, ou islã, tem por base o Corão, ou Alcorão - livro sagrado dos muçulmanos. O islamismo teve origem na Arábia, região localizada no sudoeste da Ásia. A península arábica - a maior do mundo - é um grande planalto cercado ao leste e ao sul por montanhas. Ocupa quase todo o Oriente Médio, prolongando-se no mar da Arábia (parte do Oceano Índico). Na costa oeste da península, o mar Vermelho separa a região da África. A península arábica abrange uma das maiores zonas de desertos arenosos do mundo; seu clima é extremamente quente e a terra, seca. A agricultura na área é praticamente inexistente e o cultivo é possível somente em pequena escala, em áreas chamadas de oásis*. Por isso, no decorrer dos milênios, grande parte da população que habitava a área dedicou-se quase que exclusivamente ao pastoreio.

*Oásis são pequenas áreas de terra férteis em meio a desertos, supridas de água por uma espécie de fonte ou poço.

Arábia pré-islâmica

Em seus primórdios, a maior parte do povo da Arábia era composta por beduínos: tribos nômades pastoris de origem semita. Em constante disputa por oásis e poços de água, estas tribos viviam dispersas e se deslocavam constantemente de um oásis para outro em busca de água e pasto para suas ovelhas, cabras e camelos.

Em linhas gerais, do início de seu povoamento até o fim do século VI, a Arábia não possuía um poder político centralizado; não haviam leis escritas e não existia sistema legal constituído. Tudo girava em volta da tribo. Laços de sangue uniam os membros de cada tribo que dependiam um dos outros para proteção. Se um deles era assassinado, toda a linhagem sofria. As dificuldades que enfrentavam para sobreviver no deserto fizeram com que os beduínos formassem uma cultura de valores baseados em lealdade, bravura em combate e honra. Na Arábia pré-islâmica, a maioria dos árabes que viviam no deserto cultuavam deuses tribais (politeísmo), que acreditavam viver nas pedras, na areia, no sol e nas estrelas. Não havia unidade religiosa; cada grupo possuía seus próprios deuses. Só nas cidades e centros comerciais que, aos poucos foram surgindo, acabou sendo introduzido o ensino do judaísmo e do cristianismo.

Em linhas gerais podemos dividir a Arábia pré-islâmica em:

Arábia desértica: nesta região, que corresponde à maioria do território árabe, viviam os beduínos, tribos nômades pastoris em constante disputa por oásis e fontes de água.

Arábia feliz: esta região era formada por tribos sedentárias, organizadas sob forma de clãs familiares, que, nas regiões litorâneas da Península Arábica, desenvolviam uma economia agrícola e mercantil. Nela surgiram as principais cidades árabes e centros comerciais como Meca e Yatreb (Medina). Nestas cidades surge uma aristocracia mercantil.

Meca: um centro comercial e religioso

A posição estratégica da cidade de Meca, entre as várias rotas de caravanas, fez com que a cidade adquirisse desde a antiguidade grande importância comercial, tornando-se posto de parada das caravanas que transitavam pela península Arábica e ligavam o Oriente ao norte da África. Em Meca a aristocracia mercantil – que negociava com o papel, desenvolvido pela tribo coraixita - dominava o comércio.

Meca, além de ser um importante centro comercial, era desde a antiguidade um centro religioso. A cidade foi citada pela primeira vez pelo geógrafo egípcio Ptolomeu, no século II d.C., com o nome de Makoraba.

Sabe-se, pois, que os árabes eram politeístas, cada tribo cultuando seus próprios ancestrais sob a forma de ídolos. Estes, segundo a tradição, estavam na Caaba (Pedra Negra), o templo de Meca. A Caaba continha mais de 360 deuses pertencentes às tribos do deserto. O deus principal era simbolizado por uma “pedra negra” que, segundo uma antiga tradição, era sagrada e havia sido enviada dos céus. A cada ano, Meca era visitada por milhares de peregrinos, oriundos de todas as regiões da Península Arábica, dinamizando o comércio e gerando uma riqueza considerável para os mercadores da cidade. Cabia aos comerciantes da Meca a guarda da Caaba.

Na época de Maomé, verificou-se que, em várias partes, a transição da sociedade beduína e nômade para uma sociedade urbana mais fixa foi, aos poucos, causando a extinção da religião tradicional e o crescimento da influência das duas grandes religiões monoteístas: o judaísmo e o cristianismo.

O islamismo: o Profeta Maomé

O homem responsável pela mudança da vida do mundo árabe foi o Profeta Maomé (570 - 632). Com ele surgiu uma nova religião, o islamismo, que garantiu à Arábia a unidade política. Informações sobre sua vida estão nos textos escritos, em árabe, por eruditos muçulmanos.

Maomé nasceu na cidade de Meca (cidade ainda existente na Arábia Saudita, hoje) por volta de 570, em uma família pobre da tribo coraixita. Órfão, muito cedo se tornou pastor, ocupação na qual permaneceu até os 20 anos. Empregou-se, então, na caravana de uma rica viúva chamada Khadija, com quem mais tarde veio a se casar e com quem teve uma filha, Fátima. Maomé era conhecido por sua honestidade e habilidade nos negócios.

Segundo a tradição, Maomé costumava se retirar para meditar em uma caverna, nas colinas fora de Meca. No ano de 610, ao completar 40 anos, teve uma experiência profética em uma caverna do monte Hira, nos arredores de Meca: o Arcanjo Gabriel, com um pergaminho, ordenou-lhe “pregar” (iqra) - “Recite em nome do teu Senhor”. Em árabe, a palavra “recitar” tem a mesma raiz que Curam, que significa “ler".

De Meca a Medina

Após um isolamento no deserto, Maomé voltou à Meca, onde começou a pregar tentando divulgar sua doutrina. Proclamou-se profeta ou mensageiro de Deus, enviado aos árabes para ensinar-lhes o caminho da salvação. Isto foi interpretado, desde o início, pelas poderosas famílias de Meca como uma tentativa de usurpar a autoridade política da cidade. Mas Maomé conseguiu muito adeptos, especialmente entre os beduínos do deserto.

Maomé condenava abertamente o politeísmo e defendia uma nova fé fundamentada na submissão a um único Deus, Alá. Os ensinamentos de Maomé, todavia, provocaram grande hostilidade entre os comerciantes da cidade e os guardiões do templo. Maomé entrava em choque com os interesses econômicos dos coraixitas que temiam que a nova religião diminuísse as peregrinações à Caaba, prejudicando assim seus negócios. Havia quem se opusesse a suas afirmações de que Alá era o único e verdadeiro Deus, por não querer abandonar os velhos deuses que seus antepassados adoravam, nem queriam perder sua influência junto à população pobre do deserto.

Maomé foi tão perseguido que, em 622 (início do calendário islâmico), para fugir de seus inimigos, dirigiu-se para Yatreb (mais tarde a cidade passou a ser chamada de Medina, “a cidade do profeta”). O episódio é conhecido como Hégira, que significa “rompimento” ou “partida”.

Os habitantes de Yatreb ou Medina receberam Maomé e seus seguidores, aderindo àquela que passou a ser a religião islâmica e divulgando-a entre os beduínos do deserto. Em Medina, Maomé deu prosseguimento à sua pregação e passou a organizar a comunidade. Maomé conseguiu impor uma única religião, elemento determinante para a unificação política da região. O profeta se tornou um líder religioso e político, rejeitou as leis tribais, determinando que a lei do islâmica passava a ser a autoridade suprema em todos os assuntos.

Para vencer seus inimigos – os ricos comerciantes de Meca – iniciou um jihad- batalha. Maomé queria obter o controle da cidade de Meca. Queria também difundir a nova religião. O islamismo devia difundir-se por meio de conquistas militares. O nome dado a estas lutas, jihad, é o mesmo que mais tarde é usado para designar a guerra santa. A luta para causa de Alá ganha precedência sobre todos os outros interesses, bem como sobre as tradições e os conceitos morais e religiosos herdados do passado.

Em pouco tempo, uma legião de adeptos se junta a Maomé e seus seguidores. Em 630 a cidade da Meca se rende, sem lutas. Maomé entra em Caaba e destrói os ídolos, símbolos da religião politeísta, conservando apenas a pedra negra. Tribos beduínas de toda a Arábia se converteram ao islamismo e aceitaram a autoridade de Maomé como profeta final. Até sua morte, em 632, Maomé tinha conseguido unir a Arábia, transformando-a num só domínio onde a religião se tornara mais importante que os antigos laços familiares ou tribais.

Após a morte do profeta Maomé, seu amigo Abu Bakr se tornara o líder absoluto do Islã, assumindo o posto de califa - chefe político e religioso de um estado muçulmano.

Os muçulmanos passaram a ser liderados por califas, cuja autoridade era uma escolha divina. O califa governava de acordo com as leis do Alcorão e assumia o papel de Defensor da Fé. Os três primeiros califas, após a morte de Maomé, eram parentes do profeta ou estavam entre os primeiros convertidos.

Maomé - líder religioso e político

Maomé, o Profeta, acreditava ser instrumento de Deus, enviado aos árabes para ensinar-lhes o caminho da salvação. Maomé atacou com veemência o politeísmo dos árabes, pois acreditava num só Deus, Criador e Juiz. Estava convencido que havia sido escolhido como profeta para trazer aos árabes uma nova religião, que passou a ser chamada de Islã ou islamismo. A palavra significa "submissão”, já que em árabe significa “render-se a Alá” (Alá é a palavra árabe para Deus). Os seguidores do islamismo eram chamados de muçulmanos, isto é, “aqueles que se submetiam a Deus”.

Entre os ensinamentos que o profeta transmitiu a seus seguidores está um rígido código moral e ético, que inclui alertas e proibições. Entre as principais proibições estão: a ganância e a desonestidade nos negócios, os jogos de azar, bebidas alcoólicas e o consumo de certos alimentos proibidos, assim como casamentos com não muçulmanos.

Maomé é o principal profeta do Islã e esta ideia está resumida em sua declaração de fé: “Não há Deus senão Alá, e Maomé é seu Profeta”. O Islã considera Moisés e todos os outros profetas hebreus, bem como Jesus, como “mensageiros da palavra Divina”. Mas afirma que Maomé foi o último e o maior de todos os profetas. Acredita que o islamismo é uma continuação dos ensinamentos judaicos e cristãos. Originalmente Maomé se considerava parte da comunidade judaico cristã, mas aos poucos se foi distanciando dessa ideia. Apesar de sua absoluta centralidade como profeta, em nenhuma circunstância o Islã cultua a figura de Maomé.

Corão ou Alcorão

O Alcorão é o livro sagrado do Islã e a palavra quer dizer "recitação".

"Qur'an" – manuscrito árabe sobre papel, meados do séc. XIX, Irã.

"Qur'an" – manuscrito árabe sobre papel, meados do séc. XIX, Irã.

Segundo a tradição muçulmana, o Alcorão é a Palavra de Deus: uma série de revelações de Alá (Deus) a Maomé, seu Profeta. Portanto, é o centro da vida religiosa islâmica, comparável à Torá dos judeus ou ao Novo Testamento cristão. Ainda segundo a tradição islâmica, são Revelações Divinas que não devem ser questionadas nem modificadas, sendo proibida até mesmo a sua tradução.

Os muçulmanos têm cinco obrigações religiosas básicas chamadas de “os cinco pilares do Islã”: são cinco obrigações (arkan) que constroem a fé e cuja realização é dever de todo muçulmano.

  1. Credo (chahada) - Aceitar e repetir todos os dias: "Não há outro Deus a não ser Deus e Maomé é o seu profeta”.
  2. Oração (salat) - Realizar cinco orações diárias, em horários predeterminados, com o rosto voltado para Meca.
  3. Caridade (zacat) - Os muçulmanos devem ser generosos com os mais necessitados.
  4. Jejum (saum) - Durante os 40 dias do mês do Ramadan, o nono mês do calendário islâmico, é obrigado jejuar do nascer do sol até o pôr do sol.
  5. Peregrinação a Meca (haj) - Ao menos uma vez na vida, todo muçulmano adulto que dispõe de meios de realizar uma peregrinação a Meca, deve fazê-lo.

    Curiosidade: O ritual é bastante rigoroso, marcado pela prática de dar sete voltas em torno da Caaba (mesquita situada em Meca). A peregrinação só pode ser feita uma vez por ano e em datas específicas. Atualmente, cerca de dois milhões de muçulmanos fazem o Haj. Muitos ainda o fazem a pé ou de navio, outros milhares de avião, vindos de todas as partes do mundo. O acesso à região de peregrinação só é permitido aos muçulmanos, que devem alcançar um estado de pureza ritual antes de chegar a Meca.

Após a morte do profeta foi organizada a sunna, a lei oral do Islã, que estabelece as bases da tradição e jurisprudência da nova sociedade islâmica.

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O crescimento do Islã

O islamismo se espalhou rapidamente no século seguinte à morte de Maomé. Quando Maomé morreu, em 632, toda a Arábia tinha-se convertido ao islamismo. Vários fatores permitiram a rápida expansão do Império islâmico, entre eles:

1. As duas grades potências da época – o Império Persa e o Império Bizantino - entravam em declínio, enfraquecidas por guerras e problemas internos, e o vácuo foi preenchido pelos conquistadores árabes que tinham uma nova religião pela qual lutar.

2. O islamismo deu aos árabes a união e disciplina necessárias para conquistar outros povos. A Guerra Santa ou Jihad, em árabe, transformou-se numa das motivações espirituais mais fortes para suas conquistas militares, pois, segundo as pregações do Profeta, todo aquele que morresse lutando pela expansão do reino de Alá iria direto para o paraíso. E todo seguidor de Maomé deve ser um “soldado” encarregado de levar a fé a todos os “infiéis” (jihad = guerra santa).

Tal motivação levou os árabes, comandados pelos califas, a construir um império baseado na religião islâmica. Sob o mandato dos primeiros quatro califas, que governaram de 632 a 661, os exércitos muçulmanos conquistaram a Síria, o Egito, a maior parte da Pérsia e a então Palestina (hoje, Israel).

No final do século VII, o intenso crescimento demográfico da população árabe foi outro fator que impulsionou a expansão islâmica, gerando a necessidade de novas terras.

O território islâmico alcançou no Oriente a Índia e a costa da China. Os exércitos muçulmanos também avançaram para a Ásia Menor e, apesar de não conseguirem conquistar Constantinopla, conquistaram parte do Império Bizantino. No Ocidente, os muçulmanos conquistaram o norte da África e parte da Espanha. A expansão muçulmana só foi contida na Europa por Carlos Martelo. Durante quase mil anos, os árabes muçulmanos controlaram a navegação e o comércio no Mediterrâneo, bloqueando o acesso dos europeus ao comércio com o Oriente.

O cisma do mundo islâmico: xiitas e sunitas

O cisma no mundo islâmico começou em 661, na época do quarto califa, Ali, genro de Maomé, casado com sua filha Fátima. Ali morreu assassinado e um membro da poderosa família dos omíadas exigiu o direito ao governo.

O acontecimento dividiu os muçulmanos em dois grupos rivais. Alguns, que ficaram conhecidos como sunitas, apoiaram os omíadas. Este grupo acreditava que a liderança cabia a quem controlava o poder, de fato. Enquanto outro grupo, menor, chamado de xiitas (partidários de Ali ou Shiat Ali) acreditava que o califa só podia ser um descendente direto do profeta Maomé.

Assim, a principal dissidência no Islã não foi causada por uma divisão ideológica, mas por um desacordo sobre quem deveria ser o líder. Os xiitas desafiavam constantemente os omíadas e desenvolveram, na época, certas crenças e tradições que os mantiveram separados dos sunitas. Não obstante o cisma, o Islã se espalhou rapidamente e, apoiados pela maioria dos muçulmanos, os omíadas - a primeira hereditariedade da dinastia do Islã - governaram de 661 a 750.

A expansão islâmica

Em 661, após a morte de Ali, o quarto califa, a dinastia dos omíadas tomou o poder, transferindo a capital do Império Islâmico de Medina, na Arábia, para Damasco, na Síria.

Grandes conquistadores, os califas omíadas continuaram as políticas expansionistas de seus antecessores e construíram um império islâmico ainda maior que o Império Romano, em seu auge. Conquistaram o norte da África dos bizantinos, grande parte da Espanha dos visigodos e ampliaram os domínios árabes em direção ao mar Mediterrâneo. O império islâmico se estendia dos vales hindus até o sul da França. A conquista da Europa pelos exércitos islâmicos só foi detida em 732, na batalha de Poitiers, por Carlos Martelo, do reino franco.

Mas havia descontentamento dentro do Império. Entre outros, os povos não árabes - que se haviam se tornado muçulmanos nos territórios conquistados pelo exército islâmico - ressentiam-se do fato de os árabes terem os principais cargos no governo, no exército e na sociedade. Em 750, vários grupos de descontentes, árabes e não árabes, rebelaram-se contra os governantes omíadas, vencendo-os. Assim, uma nova família, os abássidas, descendentes de Abbas, tio do profeta Maomé, tomou o califado, assumindo o poder.

A dinastia de califas abássidas governou o califado de Bagdá de 750 até 1258, quando os mongóis saquearam Bagdá e assassinaram o último califa da linha sucessória. Durante a maior parte do tempo, a corte ficou em Bagdá, cidade fundada por ordem do segundo califa abássida, Al-Mansur (754-775), em 762.Foi na corte abássida que a cultura islâmica alcançou seu ápice. Influências persas e árabes se uniram para criar uma cultura muçulmana distinta.

Durante o primeiro século de seu califado, os abássidas foram os líderes religiosos e políticos do Islã. Mas no final do século IX, os abássidas eram incapazes de exercer autoridade política ou religiosa. Do ponto de vista religioso, o poder estava nas mãos dos eruditos do Islã sunita, depois que os califas fracassaram ao tentar impor seu poder na disputa conhecida como Mihna (833-847). Em consequência, os califas ficaram limitados a um papel simbólico, líderes nominais do Islã sunita.

A Espanha sob controle muçulmano

Após a revolução abássida, que destronou os omíadas do califado de Damasco (750), Abd al-Rahman, membro da família omíada, refugiou-se no norte da África e, mais tarde, conquistou a Andaluzia (Espanha). Consolidou a força do Islã peninsular e deu início à construção da grande mesquita de Córdoba. Abd al-Rahman I fundou o emirado omíada independente de Andaluzia (756-788), que incluía a maior parte da Península Ibérica.

Os muçulmanos trouxeram prosperidade para a Espanha numa época em que o resto da Europa enfrentava sérias dificuldades. Por volta do século X, a capital espanhola de Córdoba tornara-se um grande centro de ciências e artes, rivalizando até mesmo com Bagdá. Contudo, os reinos cristãos na Espanha nunca aceitaram um governo muçulmano em Córdoba e durante séculos tentaram retomar o poder.

A queda do Império Muçulmano

A partir de meados do século VIII, o Império Islâmico começou a dar os primeiros sinais de decadência, pois apesar de estarem unidos pela mesma fé, os muçulmanos não eram unidos politicamente. Quando a dinastia omíada, responsável pelo apogeu expansionista, foi substituída pela dinastia dos abássidas, esta acabou por promover a fragmentação do império em califados independentes. Em meados do século IX, o califa de Bagdá havia perdido quase todo o poder. A invasão dos seldjúquidas ou seljúcidas - originalmente um clã pertencente a uma tribo turcomana da Ásia Central - enfraqueceu ainda mais o governo abássida. Após a invasão, mesmo que os califas abássidas ainda agissem como líderes políticos, os governantes seldjúquidas - chamados de sultões - detinham o poder político. Em 1071, os seldjúquidas estenderam os limites do islamismo, avançando para o Império Bizantino.

No sul da Europa o império foi enfraquecido pela Guerra de Reconquista - a resistência ibérica à dominação islâmica sobre a região, e o movimento das Cruzadas, iniciado no século X pelos cristãos, que reconquistaram terras muçulmanas ao longo da costa ocidental do Mediterrâneo. Nos séculos XI e XII os cristãos da Europa conseguiram retomar grande parte da Espanha e a Sicília. Finalmente, os turco-otomanos, convertidos ao islamismo entraram em choque com os árabes pelo domínio do Mediterrâneo. No século XIII, terras muçulmanas tornaram-se alvos dos mongóis que, em 1258, entraram em Bagdá, incendiando e saqueando a cidade, e assassinaram o último califa da linha sucessória. Este assassinato completou o colapso do Império Muçulmano.

Finalmente, no século XV, os turco-otomanos – convertidos ao islamismo - conquistaram a parte oriental do antigo império muçulmano, impondo a completa hegemonia na região.

O islamismo sobreviveu à quebra do império muçulmano. A fé e cultura islâmicas continuam, até hoje, a formar a vida das pessoas no Oriente Médio, norte da África e sudoeste da Ásia.

Cultura Islâmica

Cultura Islâmica

Ao fundar o islamismo, Maomé ajudou a fundar e moldar uma nova sociedade, com crenças e costumes que serviriam para unir povos de diferentes origens. Tendo suas origens na Arábia, onde viveu e pregou o Profeta Maomé, o islamismo está intimamente relacionado à cultura árabe. O Corão ou Alcorão - livro sagrado dos muçulmanos, supostamente revelado por Deus ao seu profeta Maomé - está escrito em árabe. Até hoje, o elemento árabe é muito importante no Islã, embora atualmente só uma minoria de muçulmanos é árabe, já que o islamismo está amplamente difundido em diversas regiões da África e da Ásia.

Alcorão - Irã, século XIX
Alcorão - Irã, século XIX

Relações humanas e sociais

Tradicionalmente no Islã não há distinção entre religião e política, nem entre fé e moral. A palavra árabe islam significa "submissão" e transmite algo essencial nesta religião: o homem deve se entregar a Deus e se submeter à Sua vontade em todas as situações da vida. O islamismo, portanto, regula não somente a esfera espiritual da vida de seus adeptos, mas também todos os aspectos da vida de um muçulmano, tanto no âmbito social e político como humano.

Todas as obrigações de um muçulmano estão estabelecidas pela lei islâmica - a xariá, que indica o caminho correto para a conduta humana estabelecido por Deus. Esta lei sagrada tem as bases principais descritas no Alcorão, que contém instruções fixas e rígidas sobre o governo, a sociedade, a atividade econômica, o casamento, o status da mulher, etc. Após a morte do profeta foi organizada a sunna, a lei oral do Islã, que estabelece as bases da tradição e jurisprudência da nova sociedade islâmica.

Maomé e os primeiros califas eram líderes políticos e religiosos e usavam o Alcorão como guia em todas as áreas da vida humana. A interpretação da lei sempre ocupou um lugar importante na história do Islã e, até hoje, na maioria dos países islâmicos, aqueles que têm conhecimentos jurídicos costumam atuar como líderes religiosos, pois no Islã não há um sacerdócio organizado.

Outras religiões

Com a expansão a conquista do Islã, povos de outras crenças passaram a viver sob a dominação muçulmana, sendo forçados a se converter ao islamismo. A única exceção era feita aos seguidores de outras crenças monoteístas - como o judaísmo e o cristianismo, que tinham permissão de manter sua fé. Geralmente a condição imposta aos chamados "Povos do Livro" - judeus e cristãos - era a obediência às leis islâmicas e o pagamento de um imposto especial.

Mulheres

Mulheres muçulmanas

Com o surgimento do Islã, as mulheres - apesar de não terem o mesmo status legal dos homens - ganharam alguns direitos que não tinham na Arábia pré-islâmica. O Alcorão abolira o costume existente entre as tribos beduínas que permitia matar as meninas recém-nascidas quando elas não eram desejadas. Deu às mulheres o direito a uma parte da herança e o direito de manter propriedades. Uma mulher divorciada poderia manter as propriedades que recebera de sua família ao se casar, e tinha o direito de receber do ex-marido o seu sustento; podia, além disso, casar-se novamente. Algumas das mulheres muçulmanas tinham acesso à educação e eram cultas. Contudo, o Alcorão afirmava que os homens tinham autoridade sobre as mulheres já que foram criados como sendo superiores a elas.

Um muçulmano poderia ter até quatro esposas, desde que pudesse sustentar todas com o mesmo padrão de vida. Uma mulher, porém, podia ter apenas um marido. Era extremamente difícil para uma mulher obter o divórcio, ao passo que o homem podia separar-se da esposa simplesmente dizendo três vezes: "Você é rejeitada por mim".

Com o passar do tempo, a vida das muçulmanas foi gradualmente se tornando mais restrita. Em casa, elas viviam restritas em uma área chamada harém, onde nenhum homem ou pessoa da família poderia entrar.

Escravos

As condições de vida dos escravos melhoraram sob o domínio muçulmano, pois o Alcorão afirmava que eles deviam ser tratados gentilmente e que tinham o direito de possuir propriedades. A maioria dos escravos trabalhava nas casas ou nas oficinas como ajudantes. Alguns eram extremamente cultos e se tornaram oficiais do governo, artistas ou soldados.

Ciência e cultura

No mundo muçulmano o estudo e o conhecimento eram muito importantes. O próprio Profeta Maomé incentivou muito o estudo, afirmando que "a busca pelo conhecimento é um dever de todo muçulmano, homem ou mulher".

Este interesse pelo conhecimento e por outras culturas levou um califa chamado Harun al-Rashid a se corresponder com outros governantes, entre eles Carlos Magno e o imperador da China. Alguns califas estabeleceram bibliotecas e salas de estudo em seus palácios, onde os eruditos podiam lecionar. Grandes universidades se desenvolveram em diversas partes do mundo muçulmano, atraindo estudantes de todas as partes. Havia entre eles judeus e cristãos. Antigas obras gregas clássicas foram traduzidas para o árabe, que se tornou, em todo o império, a linguagem da literatura e do saber.

Como era proibido traduzir o Alcorão para outros idiomas, era de fundamental importância aprender o árabe, no mundo muçulmano. Com a expansão do Islã, a língua em que foi escrito o Alcorão tornou-se o árabe literário usado por estudiosos. Depois da religião, a literatura foi o maior poder aglutinador das diversas culturas que compõem o mundo islâmico. O Alcorão determinou o estilo usado na literatura islâmica, bem como em trabalhos históricos, geográficos, filosóficos, científicos e, acima de tudo, na poesia. Os califas, dos quais muitos eram grandes poetas, incentivavam todo tipo de produção literária. Sob a dinastia omíada (661-750), a poesia prosperou. Com a subida ao poder da dinastia abássida, em 750, muitas obras literárias foram escritas em persa, usando a caligrafia árabe. O famoso livro "As mil e uma noites" (algumas vezes chamados de "As noites árabes") passavam-se em Bagdá, mas são uma coleção de histórias da Índia, Pérsia, Arábia e outras terras. Entre os contos mais conhecidos estão aqueles sobre Ali Babá, Aladim e a lâmpada mágica, e Simbá, o Marinheiro.

Foi graças aos filósofos árabes do Sul da Espanha que a Igreja Católica descobriu Aristóteles, o filosofo grego cujas ideias tiveram grande importância na formação do pensamento católico, durante a Idade Média.

Com a expansão do Islã, matemáticos e cientistas muçulmanos tiveram acesso a obras de pensadores e cientistas de várias regiões do mundo. Consequentemente, uma série de conceitos novos foi adquirida e repassada para o Ocidente. Da Índia, por exemplo, matemáticos muçulmanos adotaram o conceito do zero e dos números "arábicos" (1,2,3,...). Foi um matemático árabe que, no século IX, escreveu a primeira obra sobre álgebra e, como ele, vários outros desenvolveram novas ideias sobre geometria e trigonometria.

Astrônomos muçulmanos estudavam os movimentos de estrelas e planetas. Observatórios foram construídos nos grandes centros muçulmanos de Córdoba, Toledo, Bagdá e Cairo. O poeta persa Omar Khayyam, que é mais conhecido pelos poemas chamados de Rubaiyat, também era matemático e astrônomo.

Tendo acesso e usando o conhecimento médico dos antigos gregos, médicos que viviam em terras muçulmanas tornaram-se os melhores da época. No século IX, o médico persa al-Razi, ou Rabis, chefe do hospital em Bagdá, era muito consultado por profissionais da Europa.

Em termos de avanços tecnológicos sabe-se, também, que na época de ouro da civilização islâmica, os habitantes de centros urbanos e membros das cortes viviam uma vida mais confortável do que aqueles que habitavam as áreas cristãs da Europa. Mesmo na agricultura, os métodos de cultivo e irrigação nas regiões sob o domínio muçulmano eram mais avançados e eficientes do que os que eram utilizados na Europa Ocidental. Foram os árabes que introduziram na Europa vários novos alimentos, tais como laranja, limão e melão.

A arquitetura é considerada uma das mais importantes das artes islâmicas. A religião teve grande influência na arquitetura muçulmana. Em toda cidade ou vila, a mesquita (masjid) - local onde a comunidade muçulmana se reúne para orar - destacava-se de todas as outras construções. O minarete (torre da mesquita) era a estrutura mais alta da cidade, de onde um chefe religioso chamava os fiéis para rezar, cinco vezes ao dia. Não havia estátuas ou pinturas de figuras religiosas nas mesquitas, devido ao banimento da temática figurativa na tradição muçulmana. A tradição, que proibia a representação de criaturas vivas, era respeitada praticamente em todo o mundo islâmico.

Interior de uma mesquita
Interior de uma mesquita

A importância do Alcorão na cultura do Islã contribuiu para o desenvolvimento dos estilos decorativos caligráficos em todos os campos de sua arte. A palavra escrita, especialmente as inscrições do Alcorão, tinha uma importante função decorativa e passagens do Alcorão eram gravadas tanto nas paredes internas como nas externas de todas as mesquitas.

Os artesãos do mundo islâmico eram verdadeiros artistas. A cerâmica, o trabalho do vidro e de metais, assim como as encadernações de livros em couro, são um excelente exemplo das artes decorativas islâmicas. Os tapetes usados para decorar o chão e as paredes de palácios e tendas ficaram famosos ao redor do mundo. Artistas persas produziram miniaturas pintadas. Alguns detalhes nestas pinturas eram tão pequenos que não podiam ser pintados com pincel, mas com um único fio de cabelo.

Representação da viagem do Profeta Maomé
Representação da viagem do Profeta Maomé

Sumário

- Arábia pré-islâmica
- Meca
- O islamismo: o Profeta Maomé
- Corão ou Alcorão
- O crescimento do Islã
- Xiitas e sunitas
- A expansão islâmica
- Cultura Islâmica