Texto narrativo
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O texto narrativo é caracterizado por narrar uma história por meio de uma sequência de ações reais ou imaginárias. Geralmente, o texto narrativo é escrito em prosa. Alguns exemplos de textos narrativos são o romance, a novela, o conto, a crônica e a fábula.
Narrar é o mesmo que contar, relatar, informar acontecimentos. Eis aí o papel da narrativa, visto de forma geral, não teórica, não no plano literário. Deste modo, essa proposta é meramente didática, para que possa o estudante perceber a natureza da modalidade narrativa.
Normalmente, um romance, um conto, uma novela (textos pertencentes à prosa literária) são narrativas. Todavia, há narrativas em verso, por exemplo, a bela narrativa épica de Camões, Os Lusíadas.
Texto narrativo
A feitura do texto narrativo baseia-se em dois polos: o do acontecimento real, verdadeiro, conhecido e o do inventado, gerado na mente do escritor. Claro que o relato de uma viagem de férias ao planeta Marte pertence à invenção narrativa. Por outro lado, o texto que narra uma obra científica, um livro de História, uma notícia de jornal incluem-se na área da narrativa real:
“Por volta do século XII, com a desintegração do feudalismo, começa a surgir um novo sistema econômico, social e político: o capitalismo. A característica essencial do novo sistema é o fato de, nele, o trabalho ser assalariado e não servil, como no feudalismo. Outros elementos típicos do capitalismo: economia de mercado, trocas monetárias, grandes empresas e preocupação com o lucro. O capitalismo nasce da crise do sistema feudal e cresce com o desenvolvimento comercial, depois das Primeiras Cruzadas. Foi se formando aos poucos, durante o período final da Idade Média, para finalmente dominar toda a Europa Ocidental, a partir do século XVI. Mas foi somente depois da Revolução Industrial, iniciada no século XVIII na Inglaterra, que se estabeleceu o verdadeiro capitalismo.” ARRUDA. José Jobson de, História Moderna e Contemporânea. |
A narrativa de ficção apresenta uma proposta do possível de acontecer, imaginado pela criatividade do artista. Esse tipo de texto carece da verossimilhança: elemento da composição capaz de angariar a conivência do leitor para a possibilidade de ser factível o texto.
A narração é a modalidade de texto que relata fatos, acontecimentos que se desenvolvem dentro de um período de tempo. Por isto, toda narração conta algo que tem um momento inicial, um período de evolução e um processo de finalização. Há, nesse tipo de texto, uma “voz” que conversa com o leitor. Essa voz chama-se narrador. É o narrador que nos faz saber os acontecimentos trazidos no texto narrativo. Há também seres que executam ações. São as personagens.
Um narrador (aquele que conversa com o leitor) pode (ou não) fazer parte de seu relato. Leia os textos seguintes, para notar essa afirmação:
Texto 1 Anúncio de João Alves Figura o anúncio no jornal que o amigo me mandou, e está assim redigido: À procura de uma besta A partir de 6 de outubro do ano cadente, sumiu-me uma besta vermelho-escura com os seguintes característicos: calçada e ferrada de todos os membros locomotores, um pequeno quisto na base da orelha direita e crina dividida em duas seções em consequência de um golpe, cuja extensão pode alcançar de 4 a 6 centímetros, produzido por jumento. (a) João Alves Júnior
55 anos depois, prezado João Alves Júnior, tua besta vermelho-escura, mesmo que tenha aparecido, já é pó no pó. E tu mesmo, se não estou enganado,repousas suavemente no pequeno cemitério do Itambé. Mas teu anúncio continua modelo no gênero, senão para ser imitado, ao menos como objeto de admiração literária. Reparo antes de tudo na limpeza de tua linguagem. Não escreveste apressada e toscamente, como seria de esperar de tua condição rural. Pressa, não a tiveste, pois o animal desapareceu a 6 de outubro, e só a 19 de novembro recorreste à 'Cidade de Itabira'. Antes, procedestes a indagações. Falharam. Formulaste depois o raciocínio; houve roubo. Só então pegaste da pena, e traçaste um belo e nítido retrato da besta. Não disseste que todos os seus cascos estavam ferrados; preferiste dizê-lo ´de todos os membros locomotores´. Nem esqueceste esse pequeno quisto na orelha e essa divisão da crina em duas seções, que teu zelo naturalista e histórico atribuiu com a segurança a um jumento. Por ser 'muito domiciliada nas cercanias deste comércio', isto é, povoado e sua feirinha semanal, inferiste que não teria fugido, mas antes fora roubada. Contudo, não o afirmas em tom peremptório: ´tudo me induz a esse cálculo´. Revelas a prudência mineira, que não avança (ou não avançava) aquilo que não seja a evidência mesma. É cálculo, raciocínio, operação mental e desapaixonada como qualquer outra, e não denúncia formal. Finalmente - deixando de lado outras excelências de tua prosa útil - a declaração positiva: quem a aprender ou pelo menos 'notícia exata ministrar', será 'razoavelmente remunerado'. Não prometes recompensa tentadora; não fazes praça de generosidade ou largueza; acenas como o razoável, com a justa medida das coisas, que deve prevalecer mesmo no caso de bestas perdidas e entregues. Já é muito tarde para sairmos à procura de tua besta, meu caro João Alves do Itambé; entretanto essa criação volta a existir, porque soubeste descrevê-la com decoro e propriedade, num dia remoto, e o jornal a guardou e alguém hoje a descobre, e muitos outros são informados da ocorrência. Se lesses os anúncios de objetos e animais perdidos, na imprensa de hoje, ficarias triste. Já não há essa precisão de termos e essa graça no dizer, nem essa moderação nem essa atitude crítica. Não há, sobretudo, este amor à tarefa bem feita, que se pode manifestar até mesmo num anúncio de besta sumida". (Carlos Drummond de Andrade, Fala, amendoeira) |
Texto 2 O mestre de primeiras letras Unamos agora os pés de demos um salto por cima da escola, a enfadonha escola, onde aprendi a ler, escrever, contar, dar cacholetas, apanhá-las, e ir fazer diabruras, ora nos morros, ora nas praias, onde quer que fosse propício a ociosos. (Machado de Assis- Memórias póstumas de Brás Cubas) |
Texto 3 O sertanejo O sertanejo é, antes de tudo, um forte. Não tem o raquitismo exaustivo dos mestiços neurastênicos do litoral. (Euclides da Cunha, Os sertões) |
Note o seguinte: no último texto, de Euclides da Cunha, há um narrador que não se inclui no relato; ele fala como se estivesse observando, de fora. O que relata não ocorre com ele próprio, mas com o sertanejo.
Os elementos de uma narrativa
Ação é movimento. Uma narrativa não é estática, já que os episódios se sucedem, os processos verbais são nocionais (verbos de ação). Os verbos expressam a "vida vivida" pelas personagens e isto constitui o que os teóricos chamam de ação na narrativa.
Repare que, para que haja ação, não basta uma sequência de episódios. É necessário encadeamento lógico entre esses fatos e esse encadeamento produz um conjunto de fatos vinculados a um mesmo propósito. A ação é produto das atitudes da personagem: sujeito dos processos narrados.
Leia o texto seguinte e retire dele alguns processos que marcam as ações.
Texto "Uma vela para Dario" Dario vinha apressado, o guarda-chuva no braço esquerdo e, assim que dobrou a esquina, diminuiu o passo até parar, encostando-se à parede de uma casa. Foi escorregando por ela, de costas, sentou-se na calçada, ainda úmida da chuva, e descansou na pedra o cachimbo. Dois ou três passantes rodearam-no e indagaram se não se sentia bem. Dario abriu a boca, moveu os lábios, mas não se ouviu resposta. Um senhor gordo, de branco, sugeriu que devia sofrer algum ataque. Ele reclinou-se mais um pouco, estendido agora na calçada. E o cachimbo tinha apagado. Um rapaz de bigode pediu ao grupo que se afastasse e o deixasse respirar. E abriu-lhe o paletó, o colarinho, a gravata e a cinta. Quando lhe retiraram os sapatos, Dario roncou feio e bolhas de espuma surgiram no canto da boca. Cada pessoa que chegava se punha na ponta dos pés, embora não o pudesse ver. Os moradores da rua conversavam de uma porta à outra, as crianças foram acordadas e vieram de pijama às janelas. O senhor gordo repetia que Dario sentara-se na calçada, soprando ainda a fumaça do cachimbo e encostando o guarda-chuva na parede. Mas não se via o guarda-chuva ou o cachimbo ao lado dele. Uma velhinha de cabeça grisalha gritou que ele estava morrendo. Um grupo transportou-o na direção do táxi estacionado na esquina. Haviam introduzido no carro metade do corpo, quando o motorista protestou: se ele finasse na viagem? Concordaram em chamar a ambulância. Dario foi conduzido de volta e recostado à parede — não tinha os sapatos e ao alfinete de pérola na gravata. Alguém informou que na outra rua existia uma farmácia. Não carregaram Dario além da esquina; a farmácia era no fim do quarteirão e, além do mais, ele estava muito pesado. Foi largado ali na porta de uma peixaria. Imediatamente um enxame de moscas lhe cobriu o rosto, sem que fizesse o menor gesto para espantá-las. As mesas de um café próximo foram ocupadas pelas pessoas que tinham vindo apreciar o incidente e , agora, comendo e bebendo, gozavam as delícias da noite. Dario ficou torto como o deixaram, no degrau da peixaria, sem o relógio de pulso. Um terceiro sugeriu que lhe examinassem os documentos. Vários objetos foram retirados dos seus bolsos e alinhados sobre a camisa branca. Ficaram sabendo seu nome, idade, cor dos olhos, sinais de nascença, mas o endereço na carteira era de outra cidade. Registrou-se tumulto na massa de mais de duzentos curiosos, que a essa hora, ocupava toda a rua e as calçadas: era a polícia. O carro negro investiu contra a multidão e várias pessoas tropeçaram no corpo de Dario, que foi pisoteado dezessete vezes. O guarda aproximou-se do cadáver e não pôde identificá-lo — os bolsos vazios. Restava apenas a aliança de ouro na mão esquerda, que ele próprio — quando vivo — não podia retirar do dedo senão umedecendo-a com sabonete. Ficou decidido que o caso era com o rabecão. A última boca repetiu: — "Ele morreu, ele morreu", e então a gente começou a se dispersar. Dario havia levado quase duas horas para morrer e ninguém acreditara que estivesse no fim. Agora, os que podiam olhá-lo, viam que tinha todo o ar de um defunto. Um senhor piedoso despiu o paletó de Dario para lhe sustentar a cabeça. Cruzou suas mãos no peito. Não pôde fechar os olhos nem a boca, onde as bolhas de espuma haviam desaparecido. Era apenas um homem morto e a multidão se espalhou rapidamente, as mesas do café voltaram a ficar vazias. Demoravam-se nas janelas alguns moradores, que haviam trazido almofadas para descansar os cotovelos. Um menino de cor e descalço veio com uma vela, que acendeu ao lado do cadáver. Parecia morto há muitos anos, quase o retrato de um morto desbotado pela chuva. Fecharam-se uma a uma as janelas e, três horas depois, lá estava Dario à espera do rabecão. A cabeça agora na pedra, sem o paletó, e o dedo sem a aliança. A vela tinha queimado até a metade e apagou-se às primeiras gotas de chuva, que voltava a cair. (Dalton Trevisan) |
Resposta:
"...vinha apressado..."; "...dobrou a esquina..."; "...diminuiu o passo..."; "...rodearam-no..."; "...reclinou-se..."; "...Uma velhinha de cabeça grisalha gritou..." etc.
Espaço na narrativa
Observe como o romancista Graciliano Ramos inicia seu apreciado livro "Vidas Secas"
Texto Mudança Na planície avermelhada os juazeiros alargavam duas manchas verdes. Os infelizes tinham caminhado o dia inteiro, estavam cansados e famintos. Ordinariamente andavam pouco, mas como haviam repousado bastante na areia do rio seco, a viagem progredira bem três léguas. Fazia horas que procuravam uma sombra. A folhagem dos juazeiros apareceu longe, através dos galhos pelados da catinga rala. |
A vida de Fabiano e seus acompanhantes passa a tomar forma a partir do espaço que eles ocupam. Daí a importância da construção de um espaço adequado ao fio da narrativa. Na obra de Graciliano, o espaço, aliado ao tempo, é fator preponderante para a situação desgraçada que vivem as personagens.
Tempo na narrativa
Leia o texto seguinte, atentando para a questão do tempo em que os fatos ocorrem.
Galo de briga com a vista vazada morre da banda cega. Todas as desgraças passam a chegar-lhe do lado escuro; o adversário mal percebe a fraqueza do outro, descruza e cruza de novo o pescoço, e batoqueia e esporeia sem só nem piedade, na nova e vantajosa posição. O mesmo aconteceu com o boi curraleiro, neste caso verdadeiro passado em noite de lua, na fazendo do Boi Solto. Com a diferença de que a vantagem não levou o outro marruco brigão, e sim uma cobra sucuri. Mário Palmério, Vila dos Confins |
A relação entre espaço e tempo constitui um dado importante na estrutura da narrativa e convergem para habilitar o processo da ação das personagens. Assim, é possível ver-se que todos os constituintes dessa composição têm sua importância particular e formam a importância do todo. Leia muitos textos narrativos, preferencialmente dos bons autores brasileiros e note sempre os elementos constituintes de tal modalidade. Você apreciará muito mais a leitura.
A seguir, apresentamos-lhe um texto para que você o aprecie. Atente para a evolução do tempo em que se sucedem os fatos narrados.
"...O outro mudava de cores, recuava trôpego, a língua presa, quase a chorar, numa aflição de culpado, o olhar azul submisso refletindo a imagem do negro: (CAMINHA. Adolfo, Bom-Crioulo.) |
A técnica narrativa trabalha, pelo menos, dois processos temporais: o tempo cronológico e o tempo psicológico.
Tempo cronológico: É a marcação dos episódios dentro do cronos, ou seja, indica o ano, o dia, mês ou hora, em conformidade com o calendário. O tempo cronológico é real, é consonante com a percepção de duração do leitor. Machado de Assis traz em suas obras belos exemplos da exploração do tempo cronológico, como se pode observar no fragmento de Memorial de Aires:
“Ora bem, faz hoje um ano que voltei definitivamente da Europa. O que me lembrou esta data foi, estando a beber café, o pregão de um vendedor de vassouras e espanadores: “Vai vassouras! Vai espanadores!”. Costumo ouvi-lo outras manhãs, mas desta vez trouxe-me à memória o dia do desembarque, quando cheguei aposentado à minha terra, ao meu Catete, à minha língua. Era o mesmo que ouvi há um ano, em 1887, e talvez fosse a mesma boca.”
Tempo psicológico: Marca uma pulsação interna da personagem. É uma duração subjetiva, que flui no decurso temporal, no interior da personagem. É uma sensação do tempo que flui com maior ou menor duração:
“Pelo quarto parecia-lhe estarem a se cruzar os elétricos, a estremecerem-lhe a imagem refletida. Estava a se pentear vagarosamente diante da penteadeira de três espelhos, os braços brancos e fortes arrepiavam-se à frescurazita da tarde. Os olhos não se abandonavam, os espelhos vibravam ora escuros, ora luminosos. Cá fora, duma janela mais alta, caiu à rua uma cousa pesada e fofa. Se os miúdos e o marido estivessem à casa, já lhe viria a ideia de que seria descuido deles. Os olhos não se despregavam da imagem, o pente trabalhava meditativo, o roupão aberto deixava aparecerem nos espelhos os seios entrecortados de várias raparigas. “A Noite!”, gritou o jornaleiro ao vento brando da Rua do Riachuelo, e alguma cousa arrepiou-se pressagiada. Jogou o pente à penteadeira, cantou absorta: “quem viu o par-dalzito... passou pela janela... voou p’ralém do Mi-nho!” — mas, colérica, fechou-se dura como um leque. Deitou-se, abanava-se impaciente com um jornal a farfalhar no quarto. Pegou o lenço, aspirava-o a comprimir o bordado áspero com os dedos avermelhados. Punha-se de novo a abanar-se, quase a sorrir. Ai, ai, suspirou a rir.” (...) LISPECTOR. Clarice, Devaneio e embriaguez duma rapariga. |
Sumário
- Os elementos de uma narrativai. Espaço na narrativa
ii. Tempo na narrativa
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